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domingo, 27 de janeiro de 2013

"VIRA PARA LÁ ESSA MERDA!", uma frase de JAIME NEVES para a HISTÓRIA de PORTUGAL


Morreu o major Jaime Neves. Foi com esta patente militar que o conheci pessoalmente. Era já um ícone, uma lenda do Exército Português e da força de "Comandos". 
Terreiro do Paço. 25 de Abril de 1974. A situação das forças revolucionárias comandadas pelo saudoso capitão Salgueiro Maia encontra-se periclitante. O poder de fogo dos carros de combate M-47, do Regimento de Cavalaria 7, apoiante do regime do Estado Novo, é incomensuravelmente superior ao das Panhard, Chaimite e Daimler da Escola Prática de Cavalaria. Se os carros pesados do brigadeiro Junqueira dos Reis e 
a fragata do comandante Louçã (pai do ex-coordenador do Bloco de Esquerda) dispararem o golpe de estado cairá por terra num mar de sangue e destroços. 
Na Rua do Arsenal, solitário, com um heróico sangue-frio, frente aos dois M-47 que ocupam a largura da via, o major Jaime Neves grita para o major Pato Anselmo: "Vira para lá essa merda!".
A "essa merda" referia-se aos mortíferos canhões de 90mm dos M-47. O major Pato Anselmo cedeu e mandou rodar as peças em direcção ao rio Tejo. Um dos momentos críticos do levantamento militar do 25 de Abril fora ultrapassado. Posteriormente, com o seu 10º grupo de Comandos foi "conquistar" a Legião Portuguesa, na Penha de França. 
Almoçámos numa tarde gelada de Fevereiro de 1975, no Centro de Instrução de Operações Especiais, em Lamego, quando uma vasta coluna do Regimento de Comandos se empenhou na Operação Nortada, uma incursão pedagógica ao interior do País. Também se encontrava presente o alferes Marcelino da Mata, o "comando africano" mais condecorado do Exército Português. 
O major Jaime Neves nunca escondeu, antes do golpe do 25 de Novembro, que além dos objectivos militares seria necessário erradicar o PCP da vida política portuguesa. Porém, quer o tenente-coronel Ramalho Eanes como o tenente-coronel Melo Egídio persuadiram-no a mudar de ideias, após negociações complexas do então presidente da República, Costa Gomes, com o general Otelo Saraiva de Carvalho, comandante do COPCON, e Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP, tudo na perspectiva de se evitar a guerra civil que se adivinhava e que motivou a fuga de Mário Soares e vários outros socialistas para o Porto, onde se dispunham a concentrar o Poder, com o apoio do brigadeiro Pires Veloso e muitos outros elementos da extrema-direita, alguns deles ligados à rede bombista do MDLP, responsável por vários actos terroristas em Portugal.
Com o PCP e o COPCON fora de acção, Jaime Neves e o seu Regimento de Comandos atacaram o Regimento de Polícia Militar, comandado pelo major Campos de Andrada e o major Tomé (o político da UDP) e após violenta troca de tiros foram abatidos dois "comandos" e um "polícia militar". Só a grande capacidade de liderança e carisma de Jaime Neves evitou que os seus soldados partissem para a vingança pela morte dos camaradas e chacinassem os aterrorizados PM's que rapidamente se renderam.
Sempre frontal e directo, nunca se furtou às questões mais incómodas sobre a Guerra de África, onde combateu em todas as frentes. Quando inquirido sobre a violência de algumas acções, Jaime Neves, ao contrário de muitos outros, não se encolheu nos labirintos da retórica. "Quando nos mandavam "limpar" era mesmo para "limpar" tudo!"
Bon-vivant, noctívago, audaz e carismático, o major Jaime Neves viveu sempre nos limites. Sobrevive o mito. 
Foi um prazer conhecê-lo. Até sempre!