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domingo, 13 de março de 2011

Uma recordação (agitada) de BILBAO

Nos anos 80 fui fazer uma reportagem a Bilbao. Passei lá uma semana deliciosa.Bilbao é uma cidade cinzenta, muito industrializada, com dezenas de bancos aglomerados em meia dúzia de ruas, está rodeada por uma cadeia de montanhas e para animar ainda mais a paisagem geral tem um cemitério ao fundo da pista do aeroporto e uma cruz enorme no topo de uma montanha no lado oposto da pista para perpetuar a memória de um desastre de avião. O aparelho não conseguiu elevar-se a tempo, desfez-se contra a serrania e todos acabaram a viagem no "outro mundo". Ah, e naquela altura ainda não havia o Guggenheim para visitar...
O povo basco adora e admira os portugueses. É a única região de Espanha que nutre um sincero respeito por nós. A razão é simples: conseguimos separar-nos definitivamente dos castelhanos após a terrível batalha das Linhas de Elvas e fazer um grande manguito ao Filipe IV deles que mandava em nós como Filipe III até o Miguel de Vasconcelos sair a voar por uma janela. 
O País Basco vivia naquela época uma tremenda turbulência com os atentados da ETA a sucederem-se quase diariamente e a cidade de Bilbao em autêntico estado de sítio. Houve uma tarde em que vi o caso mal parado. Sem querer e sem o saber vi-me arrastado por uma manifestação de "etarras" e, meus amigos, aquilo não tinha qualquer semelhança com o bem comportadinho protesto da Geração à Rasca. Choviam os "cocktails Molotov" incendiários sobre a Polícia, esta ripostava com tiros e granadas de fumos e travavam-se violentos combates corpo-a-corpo entre os agentes da autoridade e os nacionalistas bascos. 
No meio do pandemónio deparei-me com o meu colega fotógrafo António Capela, já falecido,  impávido e sereno a fotografar aquele caos sangrento. Lá escapámos os dois sem sermos atingidos por bastonadas, navalhadas, tiros, granadas ou "cocktails" e refugiá-mo-nos num restaurante a comer um delicioso "pata negra" e a beber uns copos do real tinto "Sangre del Toro". 
Depois de uma semana a trabalhar, a comer do bom, a beber do melhor, a divertir-me nas discotecas com as "terríveis" bascas, a dar umas saltadas a San Sebastian, a apreciar uma inesquecível refeição em Portugalete e a passar incólume por entre as sangrentas manifestações chegou a hora de regressar. Como qualquer ser normal quando viaja, comprei uma recordação da minha estada em Bilbao. O "recuerdo" é que não era muito normal, valha a verdade. Passei por uma montra com o meu amigo José Manuel Freitas, vi um revólver Remington 45 e não resisti à tentação. Desembolsei quase dez mil pesetas mas fiquei feliz da vida com a arma. 
Cheguei ao aeroporto, polvilhado de polícias armados de metralhadores não fosse a ETA tecê-las, com o José Manuel Freitas, que trazia um urso de peluche quase em tamanho real para a filha. Antes de meter a mala no raio-x das bagagens tirei a pistola para fora para a mostrar aos agentes alfandegários. Mal viram a minha recordação da tão acolhedora cidade de Bilbao caíram-me em cima três polícias que me algemaram e trataram como se eu fosse o terrorista mais perigoso do Mundo. E fui preso, obviamente. Interrogaram-me minuciosamente mas atenderem às minhas explicações é que nada de nada, verificaram a arma e toda a gente dentro do avião à espera que o meu problema se resolvesse. Furiosos e impacientes.
No meio dos meus azares, porém, tenho tido alguma sorte. Naquele avião viajava um pessoa importante do nosso país, cujo nome me escuso de revelar, e também o antigo presidente do Sporting, João Rocha, os quais intercederam por mim, pelas minhas boas intenções e também pela minha amada arma. Já livre das masmorras bascas entrei no super atrasado avião (esteve prestes a não descolar naquele dia porque o aeroporto encerrava às 20h00, salvo erro) sob um coro de apupos e vaias, como devem imaginar. A minha linda e querida pistola foi entregue à responsabilidade do piloto. 
À chegada a Lisboa, lá tive de andar outra vez em bolandas com a Polícia. Vocês já descobriram o motivo. Claro, a minha preciosa Remington calibre 45. Mais uma vez quis o destino que eu e ela não nos separássemos. O oficial da Polícia em serviço no aeroporto tinha estado comigo na tropa, em Santa Margarida,  quando fomos mobilizados para Angola e tudo se resolveu para que eu e a minha pistola vivamos juntos e felizes há mais de 20 anos !
Como podem ver na imagem...


"Recuerdo" de Bilbao...:P

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