Éramos amigos há quase vinte anos e andávamos sempre a embirrar um com o outro. Sem nunca nos zangarmos, claro. Dizia-lhe sempre "que mau feitio que tens, Fátima, não sei como te conseguem aturar". Ela respondia-me sempre do mesmo modo: "Olha quem fala !". Passámos dezenas de serões juntos com amigos e amigas comuns. Alguns deles em minha casa. Conversas despretensiosas para passar o tempo e rirmos de algumas cenas aqui do sítio. Cumprimentava-mo-nos só com um dedo. O mais pequenino. Quase como um código maçónico. Nessas dezenas ou centenas de noitadas cimentámos a amizade que já provinha de outras amizades. Soube há quase dez anos que ela sofria de uma doença persistente. Mas andava bem. Até há mais ou menos um ano. A partir daí começou a definhar de dia para dia. Ainda há pouco tempo a via vir da praia com o filho e mais quatro crianças que lhes foram atribuídas à sua guarda pelo tribunal. Metia-me com ela. "Estás a ficar um modelo", gracejava. No entanto, no íntimo, não augurava nada de bom. Já vira muita gente deixar o nosso convívio assim aos poucos para me enganar no "diagnóstico". Admirava a coragem dela. Não se rendia ao Destino. Fazia uma vida absolutamente normal e intensa. Há poucos anos calhou-me a mim uma daquelas crises de saúde que não desejo a ninguém. Mal me levantava da cama ou do sofá. Eis que um dia a Fátima e a Aida entraram pela minha casa dentro e limparam tudo de uma ponta à outra. Nunca esquecerei essa atitude. Amigo não é quem o diz, é quem FAZ. E ela e a Aida fizeram-no.
Agora a Fátima "partiu". Aos 40 anos. Talvez nem tanto. Não sou crente e, portanto, não sei para onde foi. Se o Céu existe ela será uma das condóminas do Paraíso. De uma coisa estou certo: nunca o São Pedro recebeu uma refilona assim. Mas no fim irão ficar Amigos. Como eu e ela.
Descansa em Paz, Fátima! Amiga !
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